quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Eu, o restaurante e os engraxates



Texto: Valdir Joaquim

Hoje, eu estava começando a almoçar, quando, de repente, dois meninos entraram no restaurante. Dois negrinhos de rosto perfeito e de pés bastante judiados, menos do que os chinelos que simulavam vestir, tal a folga que tinham.

Um pequeno pânico pôde ser percebido nos olhares das pessoas. O caixa saiu correndo para espantá-los enquanto o dono chamava o segurança lá fora falando pra eles que ali não podiam entrar. Os meninos, meio indiferentes, meio assustados, vieram certeiros na minha direção e disseram, sob os olhares de todos que largavam seus garfos e olhavam para nós: “Posso engraxar seu sapato?”

Quando eu ia responder, o dono, o caixa e o segurança disseram a uma só voz: “Aqui não pode”. Não sei o que deu em mim. Num reflexo, saí da cadeira, tirei meus dois sapatos no meio de todos, entreguei nas mãos dos meninos e falei pra engraxarem lá fora e depois me devolverem. Eles pegaram e saíram. Então, pude ouvir perfeitamente algumas vozes dizendo: “Vai ficar sem os sapatos”.

Continuei comendo calmamente, mas percebi que eles estavam demorando. E demoravam. E eu já estava terminando de comer. Na hora, desejei sinceramente que eles levassem meus sapatos. Já me imaginava indo embora andando de meias, coisa que eu adoro fazer. Além disto já via a cena dos meninos chegando em casa e dando os sapatos para seu pai e me chamando de tonto. Isto não me incomodava, comecei a desejar, queria causar. Aqui é Corinthians! Porém, se isto acontecesse, se confirmaria a suspeita de todos sobre os meninos. Então comecei a querer que eles voltassem. Queria que as pessoas refletissem sobre estes estereótipos em que se acredita doentemente.

Afinal eles voltaram, me cobraram R$ 3,50 pelo serviço. Paguei R$ 7,00 e passei a mão nas suas cabeças. Enquanto ia embora, virei pra trás e falei bem alto: “É muito bom frequentar um restaurante com serviço de engraxate, parabéns!” E fui embora zombando desta vida tão pequena.

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